Hefestos (Vulcano) Deus das artes, do fogo e dos metais

hefestoAcredito que todo ser humano chega ao mundo desejando ser amado, quando descobrimos que somos amados ou que só o somos por aquilo que fazemos ou possuímos, o poder, em alguma de suas formas, se torna o substituto, o recurso mediante o qual procuramos a aceitação e a segurança que o amor dá de graça. Assim, procuramos ser reconhecidos ou necessários, indispensáveis ou detentores do controle. Hefestos, deus consagrado à estação do inverno, nos convida a essa reflexão.

Por vivermos numa sociedade onde ainda se contempla o poder e a aparência, este deus personifica o arquétipo e indivíduo, com grande habilidade e poder criativo, que por seu aspecto repulsivo não era valorizado no reino de Zeus.

Filho de Zeus e de Hera, coxo, mal amado pelo pai e pela mãe, desposou a mais bela das deusas, Afrodite, que o traiu com Ares, seu irmão, e com inúmeros outros deuses e mortais. Segundo Homero, Hefestos foi amado por Cáris, a graça por excelência, e por muitas mulheres de grande beleza, as quais sempre eram encantadoras.

Três lendas de diferentes épocas caracterizam o papel atribuído ao ilustre artesão: teria ajudado no nascimento de Atenas ao abrir o cérebro de Zeus, onde ela estava encerrada, com um golpe de seu machado de dois gumes; por ordem de Zeus, teria prendido Prometeu no flanco de Cáucaso; enfim, teria moldado em argila o corpo de Pandora, a primeira mulher.

Esses traços permitem distinguir o valor simbólico do mito. Enfermo, coxo das duas pernas, Hefestos revela uma dupla fraqueza espiritual: a perfeição técnica das suas obras lhe basta – seu valor e sua utilização moral deixam-no indiferente. Prende Prometeu, ridiculariza Afrodite e Ares, imobiliza a própria mãe num trono de ouro. Por outro lado põe nas suas obras uma força mágica que lhe dá poder sobre aqueles que as empregam. É o técnico abusando do poder criador para impor sua vontade em outros domínios além do seu. Com suas obras primas de metal ele capta as belezas vivas. A magia das façanhas técnicas vale ao deformado os maiores sucessos amorosos.

Hefestos revela um poder distinto dos deuses atadores, amarradores da Índia e dos celtas, uma superioridade: o seu poder é tanto o de animar o imóvel quanto o de imobilizar o vivo, não só confina com laços que ninguém desata como confere movimento e vida à matéria inanimada. Tal como o pinta Homero na Ilíada: “monstro esbaforido e manco, cujas pernas débeis vacilam sob o peso do corpo”.

Mestre das artes do fogo governa o mundo industrioso dos ferreiros, dos ourives e dos operários. É visto soprando seu fogo e penando na sua bigorna em que fabrica as armas dos deuses e dos heróis; escudos resplandecentes, joias, broches, braceletes, colares para as deusas e as mais belas mortais.

Ele é o senhor do elemento ígneo e dos metais no grupo dos grandes deuses olímpicos: combate com as chamas, os metais em fusão ou barras incandescentes. Deus da metalurgia reina sobre os reinos dos vulcões, que são as suas oficinas, nas quais trabalha com os Cíclopes, seus ajudantes. É para os deuses o que Dédalo é para os homens: um inventor para o qual nenhum milagre técnico é impossível por ter grande engenhosidade.

Hefestos sempre buscou uma compensação diante de sua deformação através dos sucessos incomparáveis nas façanhas industriais e amorosas. Cultivou a habilidade, em prejuízo da identidade, o “saber fazer” à custa do “saber ser”.

Garantiu a vitória do fogo sobre a água, mas não a harmonia dos elementais. É ele mesmo o elemento ígneo no brilho da sua força irresistível. Seu andar cambeta é considerado símbolo da sua dupla natureza, ao mesmo tempo celeste e terrestre, ou como a imagem do aspecto trepidante da chama.

Rejeitado e expulso por sua própria mãe Hera, que o gerou por via partenogenética, gerando o complexo de “Filho sem pai”, a solidão torna-se intensa, assim como o sentimento de rejeição e imensa necessidade de reconhecimento social. Segundo definição da escritora Shimoda Bolen, Hefestos é o criador ferido, arquétipo do profundo instinto de trabalho e de criação a partir da forja da alma, transformando a matéria bruta em objetos maravilhosos e assim, através de sua arte, procura o amor-reconhecimento, compensando a repulsa devido a sua deformidade.

Segundo Bolen em sua obra “O Anel do Poder”, “…Precisamos de outras pessoas, que podem nos proteger ou ferir, favorecer o nosso crescimento ou prejudicá-lo, fazer com que nos sintamos seguros e inerentemente dignos ou nos encher de dúvidas e de auto-condenações. Trazemos uma capacidade humana inerente de amar os outros e de nos sentirmos bem com relação a nós mesmos quando amamos de fato e amamos aquilo que fazemos. A autenticidade e a integridade ou harmonia interior vinculam-se a escolhas feitas a partir de quem somos e do que amamos. Depressões, ansiedades, loucura, falta de autoestima, sensações de falta de sentido, violência e apegos e vícios que aliviam a dor, mas criam mais dores, surgem quando não vivenciamos a nós mesmos como pessoas que têm escolha, quando não podemos amar, quando nos vemos divididos por facções interiores adversárias, quando temos medo e suprimimos aquilo que realmente sentimos ou temos medo de reconhecer como verdadeiro. A cura começa com o reconhecimento da verdade da nossa condição.”

Imagem: eventosmitologiagrega.blogspot.com

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